ERA UMA VEZ NA ÁFRICA DO SUL
Por JMMA
Eu cá fui à África do Sul. Não vi coisas de outro Mundo (infelizmente, o nosso Mundo é mesmo assim) mas posso dizer que estive noutro Campeonato.
Era uma manhã de Abril. Em redor da península que os portugueses baptizaram de Cabo das Tormentas e depois da Boa Esperança, reina grande calmaria. Três naus com pavilhão holandês lançam ferro diante da majestosa montanha em forma de mesa, nas águas cor de turquesa da baía do Cabo. A bordo do ’Drommedaris’ encontram-se um cirurgião de trinta e quatro anos chamado Jan van Riebeek e noventa emigrantes sob o seu comando. Trabalham para a Companhia Holandesa das Índias Orientais, e vêm plantar legumes nesse local estratégico de passagem dos navios da rota das especiarias, a fim de fornecerem vitaminas às tripulações holandesas dizimadas pelo escorbuto. Não se trata de colonização e muito menos de conquista. Mas Van Riebeek não pode imaginar que ao estabelecer-se ali, em 1652, vai na realidade escrever o primeiro capítulo da história de um país que ainda não existe: a África do Sul.
Uma epopeia heróica que começa com um punhado de brancos num território que tem duas vezes e meia a superfície da França. A migração que esses migrantes entretanto empreendem pela África adentro, levados em carroções puxados por bois, é uma aventura bíblica repleta de perigos, entre eles, as tribos negras decididas a defender o seu território. Conduzidos por chefes lendários, em breve os africânderes (como se designavam) se vêem constrangidos a migrar novamente, acossados pelos ingleses, numa luta selvática pela posse das minas de ouro e diamantes entretanto descobertas. E, finalmente, mesmo quando o fumo da guerra se estava a dissipar, mesmo quando parecia que não haveria necessidade de mais caminhada, estes migrantes profundamente devotados que tinham dado ao mundo a palavra ‘Bóer’(camponês holandês), embarcavam na sua final e mais ambiciosa jornada. Inventando a palavra ‘apartheid’, elas continuaram a afastar-se da sanidade e até da própria realidade
Agora é também um dia de Abril, mas de 1994. Trezentos e quarenta e um anos, onze meses e doze dias passados sobre o desembarque de Van Riebeek na ponta do Cabo, e depois de muito sangue derramado, para o povo dos «cafres» é um dia mágico. É a ida às urnas para escolher os seus chefes. Mandela, 27 anos de cárcere, e entretanto Nobel da Paz, torna-se o primeiro presidente negro da África do Sul
Terminou o pesadelo racista, mas a África do Sul ainda tem muito a fazer para encontrar a paz e a prosperidade. E mesmo que Danny Jordaan, presidente do comité organizador, diga que este Mundial tem tanto ou mais sugnificado do que as eleições de 1994, serão os assuntos reais como a pobreza e a justiça social – esses sim – que hão-de continuar a unir ou dividir a África do Sul.
O meu cicerone nesta viagem impressionante foi ‘Um Arco-Íris na Noite’ de Dominique Lapierre (edições Planeta). Recomendo-o para férias.
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