ELE PAPA, NÓS PAPALVOS
Recentemente, um semanário resolveu brindar os leitores com as aventuras de vida de uma figura típica do nosso futebol. Uma personagem, aliás, bastante multifacetada: o Zuca Zuca Cinderela, para os amigos; o Papa, para os apaniguados; e o Engenheiro Chefe, para os cúmplices e rivais. Preferia chamar-lhe Chico Esperto, se tivesse voto na matéria.
Vendo bem, todos supomos ter uma ideia de quem é o Chico Esperto. Isto é, o Zuca Zuca. Eu tenho uma ideia do Zuca Zuca. Pinto de Sousa, ‘companhon de route’ desde os tempos do Colégio das Caldinhas que havia de chegar (vejam bem o acaso!) a Presidente da Liga de Árbitros e que é um dos arguidos do Apito Dourado, também tem uma ideia do Zuca Zuca. Os sportinguistas que em 1985 viram Futre, o «menino de ouro», ser-lhes surripiado através de um golpe rocambolesco, que incluiu aliciamento e sequestro, têm uma ideia do Zuca Zuca. As pessoas, se ainda não esqueceram quem foi o guarda Abel, o PSP com fúrias de dragão que em finais dos anos 80 comandava a guarda pretoriana do chefe azul, cuja sanha justiceira fez história na imprensa, é porque têm uma ideia do Zuca Zuca. No fundo, não há quem não tenha uma ideia do Zuca Zuca. Os adeptos, os simpatizantes, os cúmplices, os rivais, e até os leigos. Até o próprio Jorge Nuno tem certamente uma ideia sobre Pinto da Costa. O único problema é que havendo tantas ideias sobre Zuca Zuca, ninguém sabe, afinal, exacta e completamente, quem é Zuca Zuca.
Não faz de propósito, não; ele é mesmo assim. Por um lado, Zuca Zuca trai, perjura, conspira. Sacrifica o amigo para sacar Pedroto ao Boavista. Perjura o pacto de não agressão entre clubes para raptar Rui Águas. Conspira, isto é, «faz a folha» ao Presidente do clube, para assaltar o poder por via de golpe de estádio. Mas, ao mesmo tempo, Zuca Zuca mostra ser também um expoente de generosidade, devoção e amor ao próximo. Se há dias em que dá papa aos pobrezinhos do Coração da Cidade, outros há em que vai papando as pobrezinhas no platô das buates. (Percebem por que lhe chamam Papa?) Devoto, encomenda a sorte, ora, na capela do estádio, a Nossa Senhora de Fátima, ora, em campo, a sapos e a galinhas degoladas. Se obsequia os amigos com ‘fruta’, ‘rebuçadinhos’, ‘café com leite’ e outros mimos, justo é que os amigos o desenrasquem quando é preciso, seja com uma arbitragem hábil, seja com um aviso oportuno de busca judicial. Enfim, fazer o bem sempre esteve na mira do seu horizonte, no mais íntimo dos seus sonhos.
Que Zuca Zuca seja visto de forma diferente por pessoas diferentes, não admira. Mas eu disse que também tinha uma ideia de Zuca Zuca. Por acaso não anda longe da daqueles seus amigos que dizem (da boca das comadres saem as verdades) que Zuca Zuca «pelo Futebol Clube do Porto não olha a meios para atingir os fins». Concordo com esses amigos (dele), mas com uma ressalva decisiva: é que, para mim, os fins não justificam todos os meios. É possível que seja um bom dirigente. Mas era mais importante que fosse uma pessoa honesta.
Dir-me-ão que isso de ser boa pessoa – tal como a execução do hino nacional na realização de certos actos públicos – não é essencial. Pois eu acho que é. É tudo uma questão de atitude, de um certo sentido de decoro e forma de estar na vida.
(Este critério é válido para todos os Zuca Zucas. Era só o que faltava: o escabroso da fraude mudar com a cor do clube ou com o sabor das vitórias.)