quinta-feira, 10 de novembro de 2005

Colunista Convidado, por José Manuel Marques

NO DIA SEGUINTE NINGUÉM MORREU

Se isto fosse uma notícia podia começar assim: “No passado fim-de-semana, os Dementors fizeram sentir a sua acção maléfica nos estádios de futebol onde atacaram várias pessoas a torto e direito.”

A esta primeira frase ainda se podia acrescentar: “Iludindo a vigilância apertada dos feiticeiros da Ordem de Fénix, essas temíveis criaturas invisíveis precipitaram-se misteriosamente sobre alguns árbitros e treinadores e, fazendo uso do Manto Mágico da Invisibilidade, espalharam o desgosto e a confusão entre os adeptos. Inclusivamente, o técnico de umas das equipas – talvez por ser verde (tanto em termos de cor como na experiência) deu mostras de ter sido afectado pela síndrome da cegueira (in)facciosa aguda”

Isto não é uma notícia, mas os factos referidos são infelizmente verdadeiros.

Sabe-se hoje – aliás a imprensa dos Muggles não tem falado noutra coisa – que no jogo Benfica-Rio Ave, o empate dos visitantes foi conseguido misteriosamente através dum golo obtido em posição irregular, que só a uma equipa de arbitragem sob a acção dum feitiço maléfico podia ter passado despercebido. Estranhamente, já na jornada anterior, já a mesma equipa havia sido penalizada com um golo o nas mesmas condições irregulares. No jogo P.Ferreira-F.C.Porto uma grande penalidade, por mão na área, contra os portistas, passou também em claro. Em contrapartida, pouco tempo depois, o mesmo árbitro anularia ao Porto um golo perfeito, por fora-de-jogo fantasma.

Mais extraordinário, porém, foi o que se passou no Sporting-União de Leiria, onde, por artes de perlimpimpim, o guarda-redes leonino, graças aos seus dotes fantásticos, conseguiu deslumbrar o público com o que podemos chamar, na perfeita acepção da palavra, a defesa impossível. Isto é, defendeu, sentado, uma bola que já tinha passado pelo menos um metro além da linha de baliza. É obra, ou não é?

De facto, temos de concluir que os Dementors que por aí andaram a fazer estragos no passado fim-de-semana não eram nenhuns artolas. Pela qualidade do trabalho, fica ao menos a certeza de que eram, todos eles, entes credenciados nos mais Puxados Níveis de Feitiçaria pela famosa escola de Hogwarts.

E, não juro mas... quer-me até parecer que esses seres terríveis atacam nos estádios em Portugal com mais frequência do que se imagina. Inclusivamente acometendo sobre árbitros estrangeiros.

Quem não se lembra, por exemplo, do sucedido no recente Portugal-Liechtenstein (arbitragem búlgara). Pontapé de canto em vez de grande penalidade e expulsão directa quando Délia, jogador de campo, com uma das mãos, quase sobre a linha de baliza, fez sair por cima da barra um remate de Luís Figo?

Isto não é uma notícia, mas se fosse não podia dizer, como escreve J. Saramago a abrir o seu novo romance, sintomaticamente dado a público neste aziago fim-de-semana: “No dia seguinte ninguém morreu”.

Não podia dizer, porque se dissesse ou se isso acontecesse ninguém perceberia. Seria a prova provada de que os Dementors, afinal, continuavam a perturbar gravemente a normalidade do futebol com a sua acção maléfica.

Pois não é verdade que, no caso do médio Petit, protagonista duma entrada mais dura sobre Targino no jogo Benfica-Guimarães, embora o árbitro não tenha visto, a justiça funcionou? Dias depois, logo o FCP fez queixa do jogador do Benfica à Comissão Disciplinar da Liga; esta instaurou um processo «sumaríssimo»; foram convocados os seus melhores juízes; e até na Imprensa se discutiu cientificamente a intensidade e a intencionalidade do «contato» palmípede. Resultado: o clube viu o jogador penalizado com um jogo de suspensão; os órgãos de informação aplaudiram; os adversários próximos agradeceram. Enfim, o árbitro não viu mas fez-se justiça.

Portanto, se a norma é essa para os jogadores que têm entradas mais duras, sem efeito no resultado, como se explicaria a inexistência de «sumaríssimo» em relação aos árbitros que validam golos irregulares e anulam golos válidos aos olhos de toda gente? Nem um pedido de desculpas?

E a propósito: Porque é que o FCP não denuncia à justiça da Liga, para efeitos de «sumaríssimo», a falta violenta de Fábio Felício (Leiria) sobre Moutinho (Sporting) e outras quejandas, nomeadamente, no jogo da Madeira?

Não, se isto fosse uma notícia, não poderia nunca dizer que afinal “No dia seguinte ninguém morreu”.

Aliás, se isto fosse uma notícia também nunca poderia dizer, porque seria incrível, que o treinador do Sporting, acometido pela síndrome da cegueira (in)facciosa aguda declarou, primeiro que não viu a bola lá dentro, e depois que sim que entrou mas, patati-patatá...

Não obstante o evidente feitiço dos Dementors, de facto é importante reconhecer o mérito e o talento deste jovem treinador. Cita a Imprensa – e espero que não se esteja a referir ao seu homónimo Santo Padre Bento XVI – que o rapaz, para justificar os favores da arbitragem, enumerou uma lista de x penalties, y foras-de-jogo, n cartões, etc., etc. com que a sua equipa terá sido prejudicada. Só que isto repare-se, em apenas três jogos realizados! Queria o excelente técnico dizer na sua, que o árbitro ao não validar o golo que toda a gente viu que foi golo, afinal não teve senão uma decisão equilibrada. Que não «destroce» [sic] em nada, antes repõe, a verdade desportiva. Nem mais! É ou não a velha cantiga do ceguinho-zarolho que só vê o que lhe convém para pressionar árbitros e desculpar maus resultados?

Bom, se isto não é uma notícia muito menos será um altar de promessas.

Mas eu juro: Se alguma vez a oportunidade mo permitir proprei superiormente a atribuição a este «admirável modelo» luso-futebolês uma medalha. “Demérito” (tudo pegado) desportivo, pois então!

1 comentário:

  1. os árbitro não podem levar sumaríssimos porque senão ficava-se sem árbitros disponíveis para todos os jogos... tamanha é a incompetência deles.

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