quinta-feira, 13 de outubro de 2005

Colunista Convidado, por José Manuel Marques

UM FARTOTE

Uf!... Até que enfim, lá terminaram as eleições autárquicas. Com tanto discurso, tanta iniciativa de rua, tantos comícios, tantos debates, tanta promessa: uf! Confesso que já começava a estar cheio. Na verdade, desde segunda-feira, 26 de Setembro, data em que a Campanha teve o seu início oficial, que isto tem sido um fartote. Mesmo em casa, quando o que se quer é descanso, o munícipe era apanhado pela voragem propagandística das candidaturas em campanha. Se não era no canal temático, era na Um ou era na Quatro, o que eu sei é que não houve um só dia de tréguas.

Eis a agenda:

2ª – Feira, 26: Dia de abertura oficial da Campanha autárquica, directamente do Bessa, comício para a Super Liga (Boavista 2 - Académica 1);

3ª – Feira, 27: Directamente de Old Trafford, sessão de esclarecimento para emigrantes, integrada na Liga dos Campeões, e abrilhantada por estrelas como Van Niestelrooy, Guigs e Cristiano Ronaldo (Manch.United 2 – SLB 1);

4ª – Feira, 28: Directamente das Antas, comício-festa de aniversário realizado no âmbito da Liga dos Campeões; a atracção feita surpresa foi um grupo eslovaco debutante na liga milionária (FCP 2 – Artmedia 3);

5ª – Feira, 29: Directamente de Alvalade, espectáculo de circo para a Taça UEFA. A estrela do cartaz, Zvirgzdauskas, foi tão perfeito no seu número que os espectadores até pediram prolongamento (SCP 2 – Halmstads 3);

Ainda na 5ª – Feira, directamente de Braga, uma arruada, isto é, uma manifestação de rua, animada por um tal Stojkovic (guarda-redes), eleito unanimemente o melhor do espectáculo. A arruada degenerou em arruaça: agressões entre os artistas, cadeiras arremessadas das bancadas… Como é costume, a Comissão Nacional de Eleições não deu grande importância ao caso: (Braga 1 – Estrela Vermelha 1);

6ª – Feira, 30: Directamente do Restelo, debate televisivo para a Super Liga, seguido no estúdio por algumas (escassas) dezenas de apoiantes de campanha, em que a estrela neste caso foi o Estrela (Belenenses 0 - E. Amadora 2);

Sábado, 1/10: Directamente de Vila do Conde, sessão de esclarecimento eleitoral para a Super Liga em que os candidatos foram uns empatas (Rio Ave 1 – Boavista 1);

Domingo, 2: Directamente do estádio dos Barreiros, espectáculo integrado na campanha eleitoral para a Super Liga, com o entretainer Co Adriaanse, famoso pelas suas teses de campanha baseadas no chamado ataque a descoberto (FCP 2 – Marítimo 2);

Também no domingo, directamente da Mata Real, debate especializado sobre economia animado pelo candidato Peseiro. O técnico foi exímio, principalmente, em dois temas de grande relevância nacional: a escassez do crédito e a abundância de água. Enfim: depois de ter demonstrado «ao vivo» como se pode meter água num país em seca extrema, o concorrente arrisca-se a ser banido das listas. Um verdadeiro «case-study» eleitoral à atenção dos politólogos. (P.Ferreira 3 – SCP 0);

A semana (já a segunda da campanha) continuou com a actividade eleitoral a marcar presença ininterrupta nos écrans. Para seu deleite, os munícipes eleitores puderam assistir: 2ª – Feira, 3: directamente da Luz, grandioso comício eleitoral para a Super Liga, com a dupla Simão-Miccoli a alimentar o carinho dos munícipes, (SLB 2 – V. Guimarães 1); 3ª – Feira, 4: directamente do 1º de Maio, debate eleitoral (Braga 1 – Naval 0). E assim sucessivamente, na quarta, na quinta e na sexta, não com jogos mas com fait divers eleitorais, tais como a fábula do boi branco e do boi preto de Koeman; virtudes, defeitos e paradoxos do futebol espectáculo de Co Adriaanse; há ou não chicotada em Alvalade; o fervor étnico-clubista das tribos de bancada leoninas, etc. etc.

E para os munícipes eleitores não terem descanso, mesmo no sábado, dia tradicionalmente reservado à reflexão, não faltou aquela grandiosa sessão de apelo ao voto autárquico, transmitida directamente de Aveiro (Portugal 2 – Lichtenstein 1).

Isto é que tem sido um fartote!

Só que, com uma sessão eleitoral todos os dias em directo na televisão, tudo o que se passa com o futebol, nacional ou estrangeiro, é injustamente relegado para um lugar de pura subalternidade. Com tão prolongada abstinência de futebol, devo dizer que às tantas tive saudades de assistir a um joguito. Resolvi então recorrer ao vídeo e em vez de um, deliciei-me com dois jogos históricos: Porto-Torreense e Sporting-Naval da Figueira da Foz, ambos para a Taça de Portugal.

Percebe-se que o futebol, sobreposto à campanha eleitoral autárquica, se torna um espectáculo em declínio. Jogos como o Belenenses - Estrela da Amadora, Boavista – Académica e etc. não tiveram mais espectadores no estádio, cada um deles, do que uma normal sala de cinema. O pessoal quer é assistir na televisão ao seu comício autárquico, comodamente instalado no sofá.

Quando, certamente perante o fulgor dos candidatos em campanha, até o sol se eclipsou, não será de espantar este apagamento tão completo do futebol durante as autárquicas. Mas, sinceramente, começo a achar excessivo este negrume e resolvi que, de futuro, deveria deixar de haver eleições autárquicas. Ou se não puder deixar de haver (a Constituição às vezes tem os seus caprichos…) a campanha eleitoral deverá decorrer apenas no período de defeso do futebol.

Bom, desta vez passa. O futebol saiu prejudicado, mas fica a consolação de que os munícipes eleitores mostraram, ao longo da campanha, que estavam atentos e interessados em afirmar, de modo politicamente esclarecido, a sua cidadania. Os políticos brilharam, e a democracia cumpriu-se.

Apesar da dureza do Orçamento do Estado que aí vem para 2006, apesar dos desencantos da governação geral da nação, o desejável agora seria que a vida prosseguisse e que o futebol retomasse o seu curso normal. Infelizmente não estou muito certo disso. Na verdade, quando ainda não estão completamente digeridos os resultados das Autárquicas já começam a atacar o pessoal com as Presidenciais. Isto é uma tirania. Ainda se servisse para alguma coisa. No futebol normalmente ganham os melhores. Mas nas eleições (Gondomar, Felgueiras, Oeiras, Leiria) já era bom que se tivesse conseguido correr com os piores…

Vou mas é ver o joguinho de hoje (Portugal-Letónia). Enquanto é tempo.

5 comentários:

  1. :))

    Muito engraçado. Fartei-me de rir.

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  2. O meu amigo esqueceu-se no Benfica – Gondomarense.
    No Sábado teremos o lançamento das presidenciais com o Porto-Benfica.

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  3. só faltou mesmo a menção ao nosso amigo: BISALHÃO!

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  4. Sou viciado na minha profissão, o Marketing, e ao contrário da maioria não aprecio futebol. Mas à minha maneira dei por mim a pensar no fenómeno.

    Há dias, no Metro, vi um senhor com paralisia cerebral a coxear pelo cais fora, com a boca aberta e os olhos tortos, a mão suspensa junto ao peito e com um boné e uma t-shirt vermelha do benfica, que dizia "Ser do Benfica é ser Diferente!". O que é uma grande mentira! Pois é, o mau marketing é característico do Benfica.

    O Sporting tem mais classe, tem cartazes que dizem "o regresso dos indomáveis" ao melhor estilo de hollywood e provavelmente alusivo às dificuldades do Peseiro em controlar o balneário da equipa. O Benfica tem o Media Market e o Fernando Mendes.

    O Sporting tem a Game Box. O Benfica o Kit Novo Sócio.

    A claque do Sporting chama-se Juve Leo, em latim erudito. A do Benfica chama-se NoNameBoys, o que é verdade, visto que a maior parte são ilegais ou marginais sem documentos. O único latim erudito que o Benfica tem está no logo (uma roda de bina com uma águia e muitas mais coisas) e num perfume que se chama "Unum"...

    O Sporting tem presidentes com curriculum, o Benfica tem presidentes com cadastro.

    O estádio do Sporting é uma obra do pós-modernismo, uma obra de autor. O do Benfica é uma 'cesta' vermelha grande que baste para acomodar o numeroso povão.

    O ídolo do Sporting chama-se Sá Pinto. O do Benfica chama-se Mantorras. Os adeptos do Sporting pronunciam esMãn-tora logo seguido de uma gargalhadinha amarga. Os Benfiquistas pronunciam "VaiMantooooôrrasVAIVAI!VAICARALHO!AHhhFOda-se".

    Os cânticos do Sporting são coisas em francês, cheias de allez, como "Todo o estádio a cantar, todo estádio a dançar, lá lá lá lá lá allez Sporting allez, allez Sporting Allez, só eu sei, porque não fico em casa..." Os do Benfica são "S.L.Bêeee. S.L.Bêeee S.L.B. S.L.B. S.L.B.

    Glorioso S.L.Bêee Glorioooso SLBêee" ou então "BENFICA *tum tum

    tumtum* BENFICA *tum tum tum

    Tum* BENFICA"



    Conclusão: A comunicação do Sporting é muito superior ao produto! No Benfica a comunicação é muito fraca, mas suficiente para o segmento-alvo !



    Um Marketeer

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  5. Não sei quem é o Marketeer, mas gostei! Convido-o desde já a ser o nosso colunista convidado para a próxima semana, podendo abordar a temática do Marketing no futebol. Aliás este tema tem merecido uma especial atenção por algumas instituições de ensino, nomeadamente no ISCTE que abriu recentemente uma pós graduação em Marketing no Futebol. Espero que aceite o desafio.

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